Aconteceu no dia 19 de janeiro de 2010, na Igreja Nossa Senhora Aparecida, em Jandira, uma celebração eucarística em memória da Dra. Zilda Arns, fundadora da Pastoral da Criança, e por todos os mortos na tragédia do Haiti. A seguir depoimento da vereadora Maura, de Jandira, uma das iniciadoras da Pastoral em Jandira, proferida no final da celebração.
Sobre a Dra. Zilda Arns, a Pastoral da Criança e a cidade de Jandira
Sobre esta pessoa especial, dra. Zilda Arns, pela qual estamos reunidos aqui hoje em celebração, quero destacar sua trajetória em favor da família e promoção da vida através do cuidado com as crianças e com os idosos. Seu trabalho deixou lastro em todo o Brasil e América Latina. Aqui em Jandira não foi diferente: as raízes são profundas e colhemos bons frutos.
Zilda Arns costumava dizer que Deus, de certo modo, havia lhe preparado para esta missão. Baseada na experiência como médica pediatra e especialista em Sáude Pública e, também, nos muito anos na direção nos hospitais públicos de saúde materno-infantil no Paraná, acreditava que mais do que melhorar a qualidade e facilitar o acesso das mães e criança aos serviços públicos, o que mais fazia falta às mães, sobretudo as mais pobres, era o conhecimento e a solidariedade fraterna para que pudessem por em prática algumas medidas básicas, tão simples e tão capazes de salvar seus filhos da desnutrição e da morte, como por exemplo, a educação alimentar para as grávidas e seus bebês, a importância do aleitamento materno, da vacinação em dia, do soro caseiro, do controle nutricional, do asseio, além dos conhecimentos sobre sinais e sintomas de algumas enfermidades respiratórias e como preveni-las.
Princípios que nortearam a ação da Pastoral da Criança, organização social vinculada à Comissão Epicospal para o Serviço da Caridade, da Justiçã e da Paz, da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). Criada a partir do entendimento entre o então Cardeal de São Paulo, hoje Emérito, Dom Paulo Evaristo Arns com a direção da UNICEF/ONU no ano de 1982, a Pastoral ficou a cargo da dra. Zilda Arns, sua irmã, co-fundadora, a coordenação dos trabalhos.
A Pastoral da Criança nasceu com objetivos claros: a promoção do desenvolvimento integral das gestantes e das crianças entre 0 e seis anos de idade em seu ambiente familiar e em sua comunidade. Sua atuação tem caráter ecumênico, atendendo pessoas de todos os credos e etnias.
A primeira experiência contou com o apoio do Dom Geraldo Majella Agnelo, na época Arcebispo de Londrina. O trabalho iniciou-se em 1983, na Paróquia de São João Batista, município de Florestópolis, Arquidiocese de Londrina, no estado do Paraná. Este município foi eleito por apresentar uma alta taxa de mortalidade infantil (127 crianças para cada mil nascidas). Após um ano de atividades, a mortalidade infantil foi reduzida para 28 crianças para cada mil nascidas. Diante do sucesso, no ano seguinte, o trabalho da Pastoral da Criança se expandiu para outras regiões brasileiras com apoio dos bispos, bem como nos demais países da América Latina.
Atualmente no Brasil mais de 260 mil voluntários acompanham o desenvolvimento de quase 1,8 milhões de crianças de zero a seis anos e quase 94 mil gestantes em 42 mil comunidades pobres em todos os estados do país. Os voluntários da pastoral da criança, que são membros da própria comunidade, acompanham as famílias assistidas e procuram orientar sobre seus direitos e deveres, buscando uma melhor qualidade de vida conforme os princípios que nortearam a dra. Zilda.
Em Jandira os trabalhos começaram no início dos anos 90. Recordo-me de uma visita ao Estado do Acre que me marcou muito, na ocasição eu acompanha um grupo de leigos missionários italianos que participavam da chamada Universidade da Vida. Lá, em Rio Branco, conheci de perto o trabalho da Pastoral da Criança e fiquei muito impressionada.
Voltei a jandira muito empolgada com o que vivenciei e logo procurei o Padre João Carlos Pacchin, então paroco da São Francisco de Assis, e do Padre Franco Mazzoleni, da matriz Nossa Senhora Aparecida, para iniciarmos o trabalho em nossa cidade. Então contamos com os apoios fundamentais de uma lider-coordenadora regional de Osasco chamada Cristina e da Irmã Tereza de Cotia, que nos ajudaram a organizar e preparar os primeiros grupos de voluntários, assim como todo a logística necessária, não tardou muito para que o trabalho ganhasse a rua.
Hoje, já contando com quase vinte anos de atividade da Pastoral da Criança em Jandira, os resultados são animadores em relação a diminuição da taxa de mortalidade infantil. Não tenho dúvidas de que o trabalho das voluntárias foi decisivo para diminuirmos drasticamente a deste número, grande vilão da população mais pobre.
A Pastoral da Criança em Jandira atualmente conta com 36 líderes voluntárias que estão organizadas em 08 grupos: 03 na Paróquia São Francisco, 01 na Nossa Senhora de Fátima e 04 na Matriz Nossa Senhora Aparecida. Ao todo atendem cerca de 200 pessoas entre crianças e gestantes.
Trabalho desenvolvido com muito empenho e amor à causa, graças ao exemplo da dignidade do trabalho iniciado pela Dra. Zilda Arns.
Vale lembrar que em 2004, a dra. Zilda recebeu da CNBB outra missão semelhante: fundar e coordenar a Pastoral da Pessoa Idosa. Atualmente mais de cem mil idosos são acompanhados mensalmente por doze mil voluntários de 579 municípios de 141 dioceses de 25 estados brasileiros.
Dra. Zilda além dos compromissos com as duas Pastorais, partilhava seu tempo como representante titular da CNBB no Conselho Nacional de Saúde. Ela também era membro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social no governo Lula.
Dra. Zilda Arns encontrava-se no Haiti em missão humanitária, tinha acabado de participar de uma reunião na Igreja Sagrado Coração com todos os capelães para falar sobre o combate à fome. Ela preparava-se, ainda, para uma palestra sobre a Pastoral da Criança na Conferência dos Religiosos do Caribe.
Entretanto foi uma das vítimas fatais do forte terremoto que atingiu Porto Príncipe, em 12 de janeiro de 2010. Morreu como viveu: em missão pelos pequeninos. Trabalho que inclusive lhe rendeu três indicações ao Prêmio Nobel da Paz.
Ser humano de muita inspiração, seu empenho pessoal pela Pastoral fez a diferença e marcou nossa história. Estará sempre presente em nossas mentes e corações. Fica aqui nosso reconhecimento e homenagem.
Nossas orações agora se voltam, junto dela, a todas as vítimas naquele sofrido país, cujo terremoto pode ter vitimado dezenas de milhares de pessoas, entre eles brasileiros que participavam das forças de paz da ONU.
Termino este depoimento com um trecho final da palestra proferida por Zilda naquele fatídico dia, o texto está disponível na internet e termina assim:
" Como os pássaros, que cuidam de seus filhos ao fazerem um ninho no alto das árvores e nas montanhas, longe dos predadores, das ameaças e dos perigos e mais perto de Deus, devemos cuidar de nossos filhos como um bem sagrado, promover o respeito a seus direitos e protegê-los.
Muito obrigada. Que Deus acompanhe a todos ".
Jandira, 19 de janeiro de 2010,
Maura da Silva Santos Soares
